segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A canga em nome de Berlim


Em 1976, os deputados portugueses votaram e aprovaram uma Constituição que, independentemente de todos os seus méritos (q.b.) e deméritos (>q.b.), arrastou consigo uma pesada canga ideológica que custou a Portugal e aos portugueses muitos trabalhos e desgostos. Vale talvez a pena recordar que a Constituição de 1976 falava, entre muitas outras coisas absurdas, da abertura do "caminho para uma sociedade socialista" ("preâmbulo"); do facto de Portugal ser uma "República soberana [...] empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes" (artigo 1.º); ou em "assegurar a transição para o socialismo mediante a criação de condições para o exercício democrático do poder pelas classes trabalhadoras" (artigo 2.º). Nada disto reflectia a vontade dos portugueses. Era tão somente o peso de transitórias circunstâncias que não importa aqui detalhar. 
Trinta e cinco ou trinta e seis anos depois, o CDS e parte do PSD, a começar no seu presidente que também é primeiro-ministro, querem introduzir na Constituição, quando nada os obriga a isso, um conjunto de disposições que limitem o endividamento público e o deficit das contas públicas. Aparentemente, esta vontade decorrerá de compromissos assumidos e a assumir na "Europa" (i.e. Alemanha) por causa do euro. Porém, e como não é só por causa da "Europa" (i.e. Alemanha) que os partidos do Governo pretendem verter na Constituição limites à dívida e ao deficit públicos, é óbvio que parte do PSD e o CDS pretendem usar um pretexto, uma circunstância histórica que reputam favorável, para se apropriarem política e ideologicamente da Constituição, repetindo aquilo que a esquerda radical e o PCP conseguiram em 1976 e preservaram quase incólume durante cerca de uma década. Se o desiderato PSD-CDS se materializar, será mais uma machadada na dita e no regime. Resta saber quando e quem lhes dará a estocada final. Como não foi o PCP em nome de Moscovo, serão o CDS e o PSD em nome de Berlim?

3 comentários:

  1. Se os Partidos Comunistas europeus começarem a morder os calcanhares dos Liberais e dos Conservadores talvez o dinheiro que dizem que não há comece a aparecer.

    Na Russia:

    "Na mesma semana em que o país relembra os 20 anos do fim da União Soviética, o Partido Comunista russo surpreende nas urnas, após se tornar o maior beneficiário da perda de assentos do Rússia Unida na Duma. Com quase 20% dos votos, os comunistas, que mantinham 57 cadeiras na Câmara Baixa, passaram a 92 assentos, constituindo uma verdadeira força de oposição ao partido de Vladimir Putin.

    Com o lema "Antes era melhor", o partido desta vez não ficou restrito apenas aos votos de aposentados e moradores de áreas rurais. Muitos eleitores jovens e urbanos desencantados com a política no país acabaram vendo no voto nos comunistas a forma mais eficiente de demonstrar sua oposição ao governo atual.

    — Os comunistas formam o único partido verdadeiro por aí — afirmou um banqueiro em Moscou. — O Rússia Unida é uma piada, assim como o Rússia Justa e o Partido Liberal-Democrático. Então, as pessoas votam nos comunistas porque percebem que é um verdadeiro voto de oposição."

    http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2011/12/06/eleicoes-na-russia-mostram-forca-de-comunistas-420208.asp

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