segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Absolutamente


Enquanto a frase "não há alternativa" se aplicava apenas à austeridade em geral, a frase era sensata e suscitava uma aquiescência triste, mas cordata. Não era um irritante, mas uma inevitabilidade, que pessoas racionais sabiam não poder ser contornada. "Não havia alternativa." 
Depois a frase começou a azedar. Primeiro, havia quem dissesse que "não havia alternativa" com ar feliz, como quem diz, portaram-se mal, "viveram acima das vossas posses" e por isso precisam de um tratamento drástico de "austeridade". Não o Estado, não o Governo, não os políticos, não os bancos, não as pessoas imprevidentes e gastadoras, mas "todos". Ora quando chegou ao "todos", a frase tornava-se injusta, e quando se tornou habitual como um instrumento discursivo na política, começou e bem a irritar todos aqueles que sabiam não fazer parte desses "todos".
O moralismo, aliado ao paternalismo, começou a fazer estragos na "inevitabilidade". Porque uma coisa era ter de passar mal uns tempos para consertar um país, que fora muito estragado pelas governações mais recentes, outra é ter de ouvir uma reprimenda moral associada a medidas que são apresentadas como se fossem punições, palmadas no aluno mal comportado que não fez "o trabalho de casa". Diga-se de passagem que a história adolescente do "trabalho de casa" é também um pequeno irritante.
Hoje o "não há alternativa" é usado para blindar das críticas as políticas do Governo, fazendo esquecer que elas são opções entre várias "alternativas". Se não houvesse "alternativas", não precisávamos de um governo para coisa nenhuma, bastava um comité de técnicos para aplicar uma "ciência" incontestável. Não é assim e por isso a questão da qualidade da governação vem ao de cima cada vez mais, com resultados pouco brilhantes.
Por isso, estar sempre a ouvir que "não há alternativas" à medida A ou B, faz-nos lembrar o cemitério de medidas para as quais não havia "alternativa" e que ficaram pelo caminho. Por exemplo: a meia hora suplementar diária. Já chega de "inevitabilidades" que irritam.»

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